Assim que chegava ao carro, verificava sempre o bolso interior do casaco. O alto disforme confirmava. O anel estava lá. A rotina disfarçada permanecia. A quase aliança. A quase esperança. Os quase poemas inspirados.
Nesse dia, a neve na estrada rotineira obrigou-o a um rumo diferente. Acompanhava o rio. Parou o carro. Estava na beira da ponte. Não conseguia perceber porquê. Logo ele, que tinha vertigens. Olhou para o fluir da água e desejou fazer parte daquela força. Encolheu-se no casaco, mas a alma não aqueceu.
Inesperadamente o seu pé escorregou. Agarrou-se com toda a força à estrutura metálica. No peito sentia um bater desenfreado. Afinal ainda não estava pronto.
Começou como um esgar nos lábios e depressa se tornou num riso nervoso e contido. Riu alto. Riu muito. Há tanto tempo que não ria. Soube-lhe bem. O quase não era suficiente. Deu um berro. Deu outro. Berrou até ficar sem voz. As lágrimas que esperavam há muito, saíram. Os olhos cansados tinham, finalmente, paz e liberdade.
Levou a mão ao bolso perto do coração. E atirou o último quase ao rio.
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